O escândalo das fraudes em plantões médicos nos hospitais públicos provocou a segunda demissão no governo paulista. A primeira foi a do médico Jorge Pagura, secretário de Esportes. Na manhã desta segunda-feira, Ricardo Tardelli, coordenador de Serviços de Saúde do governo do estado, também pediu demissão, que foi aceita pelo secretário Giovanni Cerri. Na semana passada, 12 pessoas foram detidas por envolvimento no esquema, que permitia a médicos ganhar sem trabalhar. Oito seguem presas e três conseguiram liberdade – duas por colaborar com as investigações e uma por meio de habeas corpus.
No total, 70 pessoas são investigadas em oito hospitais públicos, entre médicos, dentistas e enfermeiros. Numa das gravações feitas com autorização da Justiça, uma conversa de Tardelli com o então diretor do Hospital de Sorocaba, Ricardo Salim, dá a entender que ele sabia do esquema.
– É a única coisa flexível que você tem e que todos têm. O resto não tem o que fazer. Então a gente tem que usar isso até para tocar o serviço – diz Salim.
– Não é uma exclusividade do conjunto do Hospital de Sorocaba. Isso tem em todo lugar. Se fizer um pente fino vai encontrar problema – afirma Tardelli.
Ricardo Salim e a mulher dele estavam entre os presos na última quinta-feira. No dia 10 de dezembro passado, Salim recebeu uma ligação de Jorge Roberto Pagura – que não estava sendo investigado pela polícia. O neurocirurgião assumiria a Secretaria de Esporte de São Paulo um mês depois.
Segundo a investigação, Ricardo Salim propõe que Pagura assine o ponto de frequência em outro hospital.
Salim: O seu ponto está sob controle. Mas daí vamos tomar cuidado, semana que vem, vamos pôr em algum lugar mais seguro.
Pagura: Tá certo.
Mas Jorge Pagura aparenta preocupação.
Pagura: Não vamos deixar pintar na boca de alguma coisa.
Salim: Exatamente. De repente, vem um cara e cutuca o que não deve.
Em um vídeo, a ex-chefe de recursos humanos do Hospital de Sorocaba, Márcia Regina Ramos, fala sobre o neurocirurgião Jorge Pagura.
Polícia: Ele vinha trabalhar?
Márcia: Não.
Polícia: Nunca veio trabalhar?
Márcia: Não.
Na última sexta-feira, em Sorocaba, no prédio da Diretoria Regional de Saúde, foram encontrados escondidos num armário os controles de frequência de Jorge Pagura. Nos documentos consta que, entre 2009 e 2010, ele deveria dar expediente no Hospital de Sorocaba de segunda à sexta, das 8h da manhã ao meio-dia.
Polícia: A frequência? Como é que fazia?
Márcia: Ele mandava a frequência para mim e eu encaminhava lá pra DRS.
Polícia: Entendi. Já vinha a frequência pronta dele?
Márcia: (balança a cabeça respondendo afirmativamente)
Márcia Regina Ramos contou ainda que este mês foi nomeada para trabalhar na Secretaria de Esporte, Lazer e Juventude – a pasta comandada por Pagura.
Márcia: Eu sou secretária.
Polícia: Secretária dele?
Márcia: É. Agora eu estou na assessoria de imprensa, mas sou secretária.
Márcia vai responder ao processo em liberdade. Em nota, Pagura disse que Márcia Regina Ramos foi nomeada para um cargo na Coordenadoria da Juventude, mas que a nomeação foi cancelada.
O secretário afirmou que nunca fez plantões no Hospital de Sorocaba, nem recebeu por eles. E que o trabalho que realizava lá era o de desenvolvimento de projetos, com verba do SUS.
Pagura é especialista em neurocirurgia e concluiu o doutorado na área em 1983 na Escola Paulista de Medicina (UNIFESP). Desde 1990 é professor titular de neurologia e neurocirurgia da Faculdade de Medicina da Fundação do ABC. Segundo currículo divulgado pelo governo paulista, trabalha nos hospitais Hospital Israelita Albert Einstein, Hospital São Luiz, Hospital Santa Paula e Hospital Paulistano. Desde 1996, chefia o serviço de neurocirurgia do Hospital Mario Covas, da Faculdade de Medicina do ABC, em Santo André. Entre 1998 e 2000, foi secretário da Saúde da prefeitura da capital. Em 1999, foi eleito membro presidente da Associação dos Clubes Esportivos e Culturais de São Paulo (ACESC).
Fonte: O Globo